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Quem tem medo da desgraça pelada?

Infância é o pedaço mais doce da vida. Há uma alegria guardada em cada canto da casa, um cada parte do quintal, em cada sombra de uma árvore. O mundo se veste de cores vivas, de brilho especial, de beleza incomparável que só os olhos de criança podem ver. Mesmo que não haja mesa farta, não se tenha vestes ricas, a vontade de brincar, de correr fala mais alto. O prazer de existir se transforma em sorrisos e tudo o que há em volta é seu, seu maior tesouro.

Mais valiosa ainda é a infância que se vive numa fazenda. É bem maior o espaço para cultivo da felicidade. Há o mato, o córrego, o pomar, as pequenas estradas. Há o sol, as nuvens, a lua, as estrelas, tudo que na cidade passa despercebido. À noite há as fogueiras, os causos, as histórias, os relatos de fantasmas, os fantasmas.  A religiosidade é mais pura, mais simples, mais santa. Na roça há uma sensibilidade maior para perceber certos fenômenos que a vida urbana desconhece.

Lembro-me de tudo, de todo esse tempo. Da fazenda, das pessoas, dos animais. Da educação recebida dos meus pais que não permitiam cara amarrada, choros, xingamentos. Às vezes, no calor da brincadeira, a gente se excedia e escapulia um “nome feio”. Logo vinha a repreensão e quase sempre um castigo. Um desses nomes, acho que o pior de todos, não gosto de repetir até nos dias de hoje, mesmo aqui na cidade depois de muitos anos. Não é fácil dizê-lo e, devo confessar, pelo medo que a Entidade representa para mim. Isso mesmo, o dono do nome sempre me aterrorizou, ou melhor, a dona do nome. O nome feio, gente, é Desgraça Pelada. Xingar capeta, diabo, desgrama e até mesmo desgraça ainda passava, o castigo era mais leve e o temor também; mas xingar esse “nome sem roupa” era inadmissível. E continua sendo para mim. Tive a prova disso neste instante: digitei-o no teclado e dei uma olhadinha para trás para confirmar se estava tudo bem, se nada estranho havia às minhas costas.

Quem passa a infância numa fazenda sabe do que estou falando. Há inúmeras pessoas por aí que têm o mesmo receio que eu. Quem tem medo da Desgraça Pelada?

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